Desembargador. Luiz Carlos relembra passagens da carreira e analisa a escalada da violência no Amapá. |
Cleber Barbosa
Da Redação
Diário do Amapá – O senhor ganhou uma bela festa de aniversário na sexta-feira. Chegou aos 69 anos não é isso?
Luiz Carlos Gomes – Pois é, eu fiquei não digo surpreso, pois somos uma verdadeira família lá no Judiciário, mas gostei muito sim. Eles resolveram fazer uma homenagem simples, com palavras, gestos e sobretudo o coral do Tribunal de Justiça que me homenageou com algumas músicas. Eu fiquei muito alegre porque a música e os perfumes são as duas coisas que mais lembram as pessoas, não é? Sobretudo a música, pois entra pelo ouvido da gente e se aloja no cérebro, como se fosse alguma coisa tocando, mexendo no cérebro da gente.
Diário – Foi tocante então?
Luiz Carlos – É, eu inclusive terminei as minhas palavras naquele evento falando da epopeia de viver. Eu acho que viver é uma epopeia, pois tem um início e um fim certos. E cada um tem o direito e o dever de traçar a sua epopeia.
Diário – E a bucólica vila de Amapá onde o senhor cresceu. Qual era o cenário em que passou sua infância por lá, no interior?
Luiz Carlos – Olha, a região em que eu vivi era município de Amapá, não na cidade de Amapá, na região do [rio] Araguari. Quando o Território [Federal do Amapá] foi criado nós só tínhamos três municípios, Mazagão, Macapá e Amapá. Depois criaram Oiapoque e Calçoene. Então o município de Amapá era muito grande, imenso e ocupara uma área onde hoje é Tartarugalzinho e ia até onde hoje é Cutias do Araguari. Eu tive uma infância muito boa, apesar de todas as dificuldades, pois não tínhamos médicos, dentistas, não tínhamos água, luz, mas nós tínhamos uma natureza maravilhosa e não faltava comida, tinha muita comida. Eu não nasci lá, fui para lá com quatro anos de idade e depois vim morar em Macapá.
Diário – O senhor é paraense de nascimento, é isso?
Luiz Carlos – Isso, mas muitas pessoas pensam que sou amapaense. É que cheguei muito cedo, vi o Território crescer, não sou pioneiro, mas convivi com muitos pioneiros. Conheci o coronel Janary Nunes, que foi governador, o Amilcar Pereira, que inclusive eu fiz campanha para ele, pois era contra o Janary... [risos] Conheci grande parte dos servidores antigos do Território, conheci uma Macapá de 30 mil habitantes.
Diário – Pegou o famoso Cabo Alfredo trabalhando aqui?
Luiz Carlos – Peguei sim, tenho até uma foto antológica com ele, ao lado do professor João Lourenço da Silva, que era diretor da Escola, o governador da época Amílcar Pereira, João Lourenço, Elfredo Távora, Amauri Farias e mais alguns, quando lançamos o Cabo Alfredo candidato a deputado federal para concorrer contra o coronel Janary. Perdemos a eleição em 1975.
Diário – E o senhor foi estudar Direito onde? Em Belém?
Luiz Carlos – Exatamente. Mas antes disso fui professor lá no município de Amapá. Lecionava Ciências, passei três anos lá, me casei e um dia chegou um juiz, Petrúcio Ferreira da Silva, que foi trabalhar sozinho, não tinha promotor e nem defensor. Ele andava por todo lugar e um dia disse que procurava alguém para lhe ajudar então me procurou convidando para trabalhar com ele, pois dizia que eu era o mais talhado para o trabalho. Ele me nomeou para eu atuar ora como promotor, ora como defensor. Deu-me alguns livros de Direito e me ensinou aquela coisa mínima, como analisar processos de habilitação para casamentos, quando eu verificava se a documentação estava toda em ordem. Trabalhei mais ou menos um ano com ele e depois fui fazer Júri, perdi uns, ganhei outros. Eu era louco para fazer medicina, mas depois de uns tempos ele me chamou e disse “o teu futuro não é Medicina, vai fazer Direito”. E fui.
Diário – Estudar em Belém?
Luiz Carlos - Exatamente, pensei bastante, pois já estava casado, tinha duas filhas. Mas pedi para um amigo fazer minha inscrição na Universidade Federal do Pará e fui fazer o vestibular. Passei, ingressei na magistratura e onze anos depois de formado cheguei à cabeça do sistema, quando virei desembargador. Foi onde me identifiquei, na área do Direito, tanto que faço o meu trabalho com muito orgulho, com muita fé e já vou me aposentar dentro de um ano.
Diário – Vai completar os setenta anos, quando a regra diz que a aposentadoria é compulsória.
Luiz Carlos – É aquilo que chamamos de expulsória... [mais risos] Mas hoje isso é até um contrassenso, pois aos 70 anos 50% das pessoas está em pleno vigor físico. É o meu caso. Tive alguns problemas de doença no ano passado, mas quem não os tem? Estou em plena forma física, mas é assim a regra do jogo, então vou aceitar e entregar a vaga para que um outro procurador mais novo do que eu, pois ele terá que ter menos de 65 anos de idade e assim possa trazer novidades, coisas boas para o Judiciário.
Diário – Então a sua vaga na composição da Corte de Justiça é do Ministério Público?
Luiz Carlos – Isso, um dos onze procuradores do MP deverá ocupar o meu lugar no próximo ano, se Deus quiser. Quem será ele vai depender deles próprios e também do governador, que é quem vai decidir um nome.
Diário – Nessa questão na composição do Tribunal nós temos duas vagas abertas, uma que a OAB já enviou uma lista sêxtupla para o quinto constitucional dos advogados e outra que foi do desembargador Dôglas Evangelista Ramos. Qual vai ser preenchida primeiro?
Luiz Carlos – Sem dúvida a do Dôglas, pois está pronta. O prazo para os sete juízes que estão concorrendo, eles têm que conhecer a vida do outro colega para ver se o que foi apresentado como documento está correto, ele pode questionar alguma coisa. Nós entregamos a todos os candidatos e nesta segunda-feira agora completa o prazo. Se não houver nenhum questionamento dos colegas reabriremos o processo na terça-feira então serão dez dias para a escolha do novo desembargador, cuja sessão já está marcada para o dia 29.
Diário – O critério é antiguidade ou merecimento?
Luiz Carlos – Merecimento.
Diário – Significa dizer que é um processo de eleição mesmo.
Luiz Carlos – E é um processo eletivo. Só que ocorreu uma mudança. A Corregedoria nos enviou toda a vida do juiz, recebemos um formulário e faremos nosso voto em casa ou em nossos gabinetes. No dia 29 vou só abrir meu voto na sessão, ficou mais fácil por isso.
Diário – Uma pesquisa recente apontou Macapá como uma das 35 cidades mais violentas do país. O que o senhor acha disso?
Luiz Carlos – Vejo com muita preocupação. Mas sempre tenho outro olhar das coisas sabe? Isso passa por uma coisa que no meu entendimento pessoal passa pelo princípio da autoridade. Parece-me que estamos vivendo a fase do coitadinho, quando a vida não é assim. É que ninguém quer punir ninguém. Ontem [sexta] vi uma reportagem que mostrava um cidadão, negro do Curiaú, que organizava as festividades de São Sebastião e dizia que não teria violência, pois mesmo que a polícia não chegasse, quem bagunçasse seria pego pela própria comunidade, que não permite arruaça. É isso que está precisando. Não digo reagir a um assalto, a reação é no sentido de não deixar a violência tomar conta da nossa sociedade. Tem que denunciar, é não se calar. Tem coisas que se pode evitar.
Diário - Uma ação preventiva?
Luiz Carlos - É a chamada persuasão. Aquilo que fazem os militares, por exemplo. Eles não querem a guerra, mas se colocam em uma posição, eles mostram que se vier o inimigo, estaremos prontos.
PERFIL
Entrevistado. O desembargador Luiz Carlos Gomes dos Santos é paraense de nascimento, mas mudou-se para o Amapá ainda criança, aos quatro anos de idade. Graduou-se em Bacharel de Direito pela Universidade Federal do Pará, em 1977. Iniciou a carreira pelo Ministério Público do Distrito federal e Territórios, como promotor público. Desde que foi empossado desembargador, em janeiro de 1991, já exerceu por duas vezes os cargos de presidente e de vice-presidente, como também de Corregedor do Tribunal Regional Eleitoral do Amapá. Foi Também presidente do Tribunal de Justiça do Amapá e, hoje, exerce, pela segunda vez, o cargo de Presidente, biênio 2013/2015, da Corte de Justiça Estadual. Deverá se aposentar em 2015.
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