domingo, 8 de novembro de 2009

Drago: “Peço desculpas pelo racionamento de energia”


Depois de provocar reações de todos os lados da sociedade, do poder público e no seio da comunidade amapaense, a Eletronorte finalmente anuncia o fim do racionamento de energia elétrica no Amapá. Muitos questionamentos e polêmicas surgiram com o episódio, especialmente de que faltou planejamento por parte da empresa resposável pela geração e transmissão de energia elétrica para os Estados amazônicos. O gerente regional da Eletronorte, Marcos Drago, foi ao rádio ontem, numa entrevista que se propôs ser esclarecedora sobre um a um os pontos polêmicos do problema elétrico. Ele dá uma passada por questões históricas como a construção da usina hidrelétrica de Coaracy Nunes e garante que em um ano a Eletronorte poderá sair da situação de déficit em suas contas. Acompanhe os proncipais trechos da entrevista concedida ao jornalista Cleber Barbosa.


Diário do Amapá - A Eletronorte esteve no olho do furacão esta semana, por conta do racionamento de energia elétrica que deixou milhares de lares às escuras por várias horas. Podemos dizer que o apagão acabou?

Marcos Drago - É o racionamento acabou. Nós conseguimos recuperar o reservatório da Usina Hidrelétrica Coaracy Nunes e aquela parcela de energia que fazia com que a gente fizesse o racionamento de energia agora já foi reconstituída através da água. É que a Petrobrás normalizou a entrega do combustível da nossa geração térmica então aquela parcela que a geração hidrelétrica contribuía estava fazendo falta, o que fez a gente racionar a energia por uma semana. Agora não há nenhum risco de racionamento, exceto em situações como essa, de falta de combustível.

Diário - Nesse dias no escuro, muitas autoridades até elevaram o tom das críticas à Eletronorte, responsável é claro pela geração de energia em nossa região. Daí a pergunta se não dava para prever que nessa época do ano em que o nível dos rios baixa muito não era prudente reforçar o estoque de óleo diesel?

Marcos - Nós temos uma tancagem de óleo de 4,7 mi-lhões de litros de óleo. Desse total, nós colocamos 2 mi-lhões de litros para situações emergenciais, ou seja, nossa reserva de segurança para situações como atrasos que venham a acontecer. A programação da Petrobras previa uma cota diária de 800 mil litros já que o nosso consumo está na faixa de 650 a 700 mil litros de óleo. Só que essa logística falhou e a entrega acontecia aos poucos, tipo 500 mil num dia, 400 mil no outro, 300 mil num outro...

Diário - E o quadro então sempre deficitário, ou seja, levando vocês a consumirem a reserva de segurança?

Marcos - Sempre, o que fez diminuir a nossa tancagem. Quando nos aproximamos da margem de segurança nós começamos a alertar a Petrobras que assim não estava dando e corríamos um risco. Na Superintendência deles em Manaus e de lá as informações eram de que as balsas estavam a caminho, só que não chegaram. Nosso consumo chegou a 900 mil litros por dia e o risco de apagão ficou iminente. Até que chegou uma balsa com 7 milhões de litros, só que à noite, não sendo possível o descarregamento.

Diário - Aí já era tarde, como se costuma dizer, não é mesmo doutor Marcos?

Marcos - Isso mesmo, aí pela manhã já começou a faltar energia. Mas a Petrobras começou a fazer as entregas, mas alegou que também houve quebra de balsa no trajeto Belém/Macapá. No dia 28 de outubro, uma quarta-feira, por volta das 9 horas da manhã, nós perdemos quadro unidades geradoras de uma vez só. Isso gerou uma interrupção de 60 megawatts em nosso sistema e a usina hidrelétrica no nível de água que está não tinha condições de atender 60 megawatts . Nós colocamos o máximo, que foi 52 megawatts e nisso a Petrobras começou a fazer as entregas mas só que são caminhões de 40 mil litros então até chegar a um nível que se pudesse gerar a gente gastava quase 8 horas entre um intervalo e outro.

Diário - Em situações normais, no inverno, por exemplo, quando o nível do reservatório da usina hidrelétrica está no ponto máximo, qual a sua capacidade geradora e que resposta ainda é necessária com a geração térmica?

Marcos - No inverno a produção na hidrelétrica chega a sua capacidade máxima, hoje de 78 megawatts. Só que a demanda do sistema, que no verão é de 170 megawatts, cai para 160 a 158 megawatts. Então há uma diferença em termos de demanda entre o inverno e o verão. Então com os 78 megawatts de geração hidráulica, precisamos produzir de 80 megawatts de geração térmica. Então para ge-rar isso, a gente precisa queimar óleo na ordem de 450 mil a 500 mil litros por dia. Como estamos no verão, estamos gastando hoje em torno de 800 mil a 850 mil litros de óleo diesel, então a Petrobras tem que entregar esse mês 21 milhões de litros de óleo para nós, para atender a demanda.

Diário - Certamente que a geração da energia térmica é mais cara que a energia hidrelétrica, no entanto a gente não tem aqui no Amapá a maior tarifa do país, como isso é possível?

Marcos - Bem, isso se deve a diversos fatores. Primeiro devido a CEA não ter equacionado o problema da sua dívida com a Eletronorte, a ANEEL, o agente regulador do sistema elétrico brasileiro, ela não dá reajuste de tarifa para a CEA, por esse motivo que a nossa tarifa aqui para o consumidor final está barata. Mas se por acaso esse problema da dívida for equacionado nós teremos com certeza o reajuste da tarifa.

Diário - Mesmo com a necessidade da geração térmica, aquela beberrona de óleo diesel?

Marcos - É interessante dizer que esse custo do óleo tem a cobertura da CCC, que significa Conta Consumo de Combustíveis Fósseis, paga por todas as empresas do setor elétrico, um condomínio onde as empresas colocam di-nheiro para subsidiar a compra desse combustível.

Diário - Quando dá isso em termos percentuais?

Marcos - Esse combustível todo hoje cerca de 35% dele é coberto pela CCC. O restante é a Eletronorte quem cobre. Então é esse o percentual subsidiado, mas tem ICMS é claro, essas coisas todas.

Diário - Ainda sobre esse problema com a CEA, alguns ex-presidentes da estatal amapaense dizem que a relação custo-benefício dela sempre foi deficitária e que a cada ano o rombo só aumenta. Mas alegam que cabe a ela um papel social, de distribuir energia em comunidades que não dão retorno financeiro, enquanto a Eletronorte não tem essa obrigação, mesmo tendo sido originada da construção da Hidrelétrica Coaracy Nunes. O que o senhor acha de tudo isso?

Marcos - São assuntos que merecem esclarecimentos. Primeiro dizer que a Eletronorte surgiu em conseqüência da CEA não é verdade. Nos anos 60 e 70 o Governo do Brasil criou empresas para fazer geração e transmissão de energia, empresas estatais por região. Na região Sul veio a Eletrosul, a mesma coisa aconteceu para o Centro-Oeste e o Sudeste, com Furnas. Para o Nordeste a Chesf e para a região Norte, a partir de 1974 a Eletronorte, para fazer a geração e transmição de energia na região Norte. Dois anos depois de ser criada, a Eletronorte assumiu a conclusão da obra da usina de Coaracy Nunes, assim como o Parque Térmico de Belém, o Parque Térmico de Manaus, o de Rondônia a mesma coisa, enfim, toda a parte de ge-ração de energia. Depois veio a construção da hidrelétrica de Tucuruí, então dizer que a Eletronorte foi originada da CEA não tem nada a ver uma coisa com a outra.

Diário - Por que a Eletronorte assumiu a construção da usina do Paredão. Havia alguma ameaça ao curso normal da obra pelo Território Federal do Amapá?

Marcos - O que eu sei é o que a história conta, de que a construção da usina começou em 1958 e em 1974 é que a Eletronorte assumiu.

Diário - Esse intervalo de 16 anos é muito grande, o que ocorreu? É normal para a época?

Marcos - Não sei a razão, não posso lhe afirmar, as dificuldades de acesso, essas coisas todas, não tenho certeza. Mas é importante dizer que a Eletronorte não é dona de Coaracy Nunes. Todo e qualquer ativo do setor elétrico pertence ao Governo Federal, que faz a concessão para que as empresas explorem aquele potencial por um determinado período. A nossa concessão da usina de Coaracy Nunes, por exemplo, termina em 2014 e a renovação a ANEEL poderá colocar isso em numa licitação pública onde qualquer empresa poderá participar e aquela que for vender a energia produzida em Coaracy Nunes pelo menor preço é que vai ser a vencedora ou então a ANEEL analisa como a Eletronorte cuidou da usina durante todo esse tempo podendo renovar essa concessão.

Diário - Voltando ao assunto do racionamento, teve quem levantasse a possibilidade de que os apagões pudessem ter sido provocados pela 46ª Expofeira Agropecuária em Fazendinha. Isso é verdade?

Marcos - Não, a Expofeira não tem nada a ver com a história, até porque todo ano nós temos o evento e a carga da feira foi de 1,5 a 2 megawatts, então o acréscimo que ela dá no sistema é insignificativo para um montante que nós temos hoje de 160 a 170 megawatts.

Diário - Nos dez dias da Expofeira faltou energia elétrica no Parque de Exposições alguma vez?

Marcos - Olha, na programação que foi desenvolvida junto com a Companhia de Eletricidade do Amapá nós colocamos a interrupção no fornecimento de energia lá pelo período do dia, pois à noite, com a quantidade muito grande de gente que visitava a feira faltar energia poderia ter ali alguma conseqüência ruim.

Diário - A gente vê toda essa ginástica que a Eletronorte faz aqui para atender a demanda do sistema Amapá então a pergunta é se as operações aqui garantem retorno financeiro para a empresa?

Marcos - Não, dá prejuízo. Vamos dizer que gastamos R$ 300 para fazer a geração de energia aqui no Estado do Amapá e arrecadamos apenas R$ 100.

Diário - Só isso? Nessa proporção?

Marcos - Nessa proporção, três para um.

Diário - E esse saldo negativo, quem arca com ele?

Marcos - A Eletronorte. Tanto é que seguidamente nós temos dado prejuízo financeiro para a empresa. É a única empresa do sistema Eletrobras que tem prejuízos na parte da geração de energia é a Eletronorte. Em que pese a gente ter uma usina no porte de Tucuruí, que é muito grande e que de alguma forma cobre alguns custos.

Diário - E por que ainda permanecer no mercado? Qualquer um já teria desistido?

Marcos - A nossa diretoria tem adotado ações para reverter esse quadro. Esse ano nós vamos dar um prejuízo bem menor e no ano que vem pelo planejamento estratégico adotado pela empresa nós já devemos entrar no azul. Para ilustrar, dois sistemas isolados nossos, o de Rondônia e o do Acre, deixaram o isolamento e agora integram-se ao sistema nacional, então não há mais a queima de combustível para esses Estados. Isso vai diminuir muito os nossos custos.

Diário - Para o senhor, o que ficou nesse episódio do racionamento de energia no Amapá?

Marcos - A gente que é profissional fica triste quando acontece uma situação como essa, pois é o nosso nome que está em jogo, a imagem da empresa, sólida construída ao longo do tempo, modelo de gestão, então diante de tudo isso a gente fica muito sentido. Mas a gente pede desculpas e diz que se empenhou o máximo. Fizemos um planejamento até a entrada da Empresa SoEnergy não haveria problema nenhum se não tivesse ocorrido o atraso no fornecimento de combustível.

Diário - O senhor também sofreu com a falta de energia em sua casa? Como é isso junto à família? Há cobranças?

Marcos - Também. A família cobra, os amigos cobram, os vizinhos também, então a gente sente também. Quando a gente ia dormir faltava energia então o que os outros consumidores sentiram a gente também sentiu. Diria que a gente sofre mais, sofre duas vezes, pois sabe dos problemas e é cobrado pelas causas. Mas estamos trabalhando sério para que situações como essas não se repitam mais.

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