quarta-feira, 25 de agosto de 2010

"Nossas ações no Amapá foram julgadas procedentes"


PASTANA - O ex-procurador regional eleitoral do Amapá mantém o estilo de falar fancamente

Para uns ele é polêmico, mas para muita gente o procurador da República Manoel Pastana é uma espécie de paladino da Justiça, um membro nato do novo Ministério Público preconizado pela Constituição da República de 1988, que ampliou a área de abrangência da instituição e garantiu até independência funcional aos procuradores e promotores. Se não bastasse uma tuação firme e aguerrida no trabalho, Pastana se notabilizou também como escritor, narrando com uma impressionante coragem em um verdadeiro livro-bomba, os bastidores da atuação ministerial e também revelando a face obscura da política nacional, com uma atenção especial a casos de corrupção envolvendo altas autoridades do Amapá. Pastana hoje atua bem longe do Amapá, no Rio Grande do Sul, mas veio a Macapá lançar a segunda e ampliada edição de sua obra "De faxineiro a procurador da República".

"No livro eu também esclareço para a sociedade o que é o Ministério Público, pois muita gente não tem uma noção. Antes da Constituição de 1988 o Ministério Público era subordinado ao Poder Executivo, era um mero braço do Executivo, um braço curtinho. Hoje o Ministério Público não é subordinado a nenhum poder."

Diário do Amapá - A noite de autógrafos do seu mais recente livro foi muito concorrida, mas não apenas de operadores do Direito ou de jornalistas, mas também de estudantes e gente interessada em passar em concursos públicos. Chama a atenção o despojamento da linguagem com que o senhor narra situações de traba-lho e nuances do Direito, até mesmo com uma boa dose de humor. Qual o objetivo?

Manoel Pastana - De fato ele tem despertado o inte-resse desde aquela pessoa que tem uma educação ainda inicial até para quem já possui uma faculdade. Na verdade é uma estratégia mesmo, porque o Direito é formal mesmo, então quando você tira a formalidade, colocando de uma forma mais simples, ele já melhora um pouco, mas também ainda fica meio amargo. Para facilitar me-lhor a degustação, você coloca um pouco de ironia nas suas narrativas até porque eu não consigo escrever um livro de receitas (risos) ou de poesia, não é o meu estilo, é literatura.

Diário - Mas procurador como é sua relação com a literatura propriamente dita, no geral?

Pastana -Se eu pudesse, eu lia tudo, todos os estilos, desde os clássicos, enfim, mas não dá. Até porque eu sou uma pessoa que gosto de viver bem, gosto de me divertir, gosto de fazer muita coisa. Então desde o início, quando eu passei a me interessar pela literatura, comecei a traçar metas de leitura então passei a ler coisas que me dessem algum retorno, alguma utilidade, no sentido pragmático e para fazer isso você tinha que estudar. Na área jurídica, por exemplo, tem determinadas áreas do Direito que é muito chato para você estudar, mas você precisa, tem que ter aquele conhecimento. O que sugiro é que mentalmente você faça imagens para tornar aquele conhecimento abstrato em algo do mundo concreto e de forma até engraçada, irônica até. Isso é estratégico. Eu ensino isso nas minhas palestras que para você degustar e ler um assunto chato, para fixá-lo mesmo, porque o importante de tudo não é só ler, é entender. Isso traz para o leitor o senso crítico, pois você não deve ser aquele leitor passivo, que diz apenas: "ah, tá legal, gostei" tem que ler e começar a discutir também.

Diário - O senhor sempre teve uma boa relação com a imprensa amapaense. Alias, isso garantiu uma identidade toda própria a seu trabalho por aqui, não é mesmo?

Pastana - Com certeza, como você bem disse, nós tivemos naquela época tempos muito difíceis e praticamente toda semana nós organizávamos uma entrevista coletiva para mostrarmos o serviço que vinha sendo feito, afinal de contas o Ministério Público é o fiscal da lei e o defensor da sociedade, então você tem que mostrar trabalho para o seu cliente, que é a sociedade, agora com responsabilidade.

Diário - Como assim, com responsabilidade?

Pastana - Por exemplo, a imprensa nunca acompa-nhou uma ação de busca e apreensão que nós tenhamos feito. Não que nós fugíssemos da imprensa, quem somos nós, mas só para a gente arrumar uma maneira e eu sempre orientava a polícia, para despistar a imprensa para ela não acompanhar a busca e a apreensão. Para se ter uma idéia, uma vez nós fizemos uma busca e apreensão na casa de um parlamentar aqui no Amapá e ninguém ficou sabendo. Era o caso de um preso que estava foragido e nós recebemos uma informação de que ele estaria de-putado, que não recordo se era estadual ou federal.

Diário - Como se deu a operação propriamente dita procurador?

Pastana - O delegado de polícia foi até a minha casa à noite falar do caso e eu disse para que ele fosse até a casa levando a equipe e dissesse ao proprietário que nós tínhamos a informação de que o foragido estaria lá. Ele deveria pedir autorização para fazer a busca e caso não fosse autorizado a ordem era para deixar a casa, mas mantê-la vigiada até que providenciássemos um Mandado de Busca e Apreensão. Agora se ele quisesse evitar tudo isso era só colaborar, afinal quem não deve não teme, não é mesmo? Nessas horas é preciso tomar todo o cuidado, de preferência com testemunhas e até filmando toda a ação, para depois ninguém alegar que houve violência. Nesse caso o delegado foi para a ação com um rádio comunicador e eu fiquei em casa acompanhando tudo, entrando pela madrugada e a imprensa não soube de nada disso.

Diário - No seu livro há um relato de uma ação dessas em que o senhor acompanhou e até fez uso de sua arma de fogo na diligência. Essa é uma prática comum para um procurador da República?

Pastana - Quando você está realizando uma busca não dá para saber o que vai ser encontrado, então em princípio você não tem a prova cabal, a prova contundente para levar adiante uma acusação ou um processo, então a gente não pode fazer uma busca como aquelas que a gente vê na televisão, midiáticas, com um monte de coisa, arrancando parede, enfim, aquele que era suspeito já vira culpado e é condenado logo em seguida pela opinião pública. Depois você vai e não interessa mais se deu ou não resultado, pois o sujeito já está condenado. Eu sou muito rígido no cumprimento da lei, mas eu procuro fazê-lo dentro da própria lei, dentro da regra e sempre respeitei isso, tanto é verdade que nossas ações aqui no Amapá foram julgadas procedentes. Nós só tivemos insucesso em uma única ação, à época no eleitoral, que nós não conseguimos reverter.

Diário - Como assim reverter?

Pastana - É que tiveram ações que nós perdemos aqui no Tribunal Regional Eleitoral (TRE) e conseguimos reverter recorrendo ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Por que isso? Porque nós trabalhávamos com esse tipo de atuação que me referi anteriormente. A imprensa toda acompanhou quando nós apresentávamos em coletivas (entrevistas) as provas todas, mas depois que nós já tínhamos certeza do que tinha acontecido de fato.

Diário - Ações como essas do Ministério Públicas e outras investigações feitas pela própria imprensa tem ajudado a passar o país a limpo, como se costuma di-zer. Mas há uma discussão sobre quem é o quarto poder no país, se a imprensa ou o Ministério Público. Qual sua opinião?

Pastana - Olha eu não sei e para mim não tem muita relevância... (risos). O mais importante disso tudo não é saber quem é o quarto poder mas sim poder exercer o teu trabalho e efetivamente poder valer aquelas garantias e prerrogativas que você tem.

Diário - São as prerrogativas garantidas aos membros do Ministério Público, é isso?

Pastana - Olha, no meu livro eu boto para fora os bastidores do Ministério Público Federal, pois existe ilegalidade. Eu serie leviano se eu dissesse genericamente que há procuradores que cometem ilegalidades, mas não eu falo quem são, digo os nomes mesmo. Cito o nome de um procurador que solicitou vantagens mi-lionárias. Só para se ter uma idéia ele pediu para várias empresas que foram beneficiadas pelo trabalho dele a importância de R$ 499 mil cujo próprio empresário se assustou. Também houve solicitação de R$ 250 mil, ou-tra de R$ 70 mil e até o Daniel Dantas pagou para esse procurador e sem que tenha acontecido absolutamente nada com ele. Ele não pegou um apena de advertência sequer. Eu cito o nome dele no livro, falo que era o procurador-geral, quem era o corregedor que não tomou nenhuma providência.

Diário - Pode-se dizer que são histórias que desnudam uma das principais instituições da nossa sociedade?

Pastana - No livro eu também esclareço para a sociedade o que é o Ministério Público, pois muita gente não tem uma noção. Antes da Constituição de 1988 o Ministério Público era subordinado ao Poder Executivo, era um mero braço do Executivo, um braço curtinho. Hoje o Ministério Público não é subordinado a nenhum poder. Ele não é um poder constituído, mas não é subordinado a nenhum Poder também. Além disso, os seus membros tem independência e autonomia para atuar, inclusive eu coloquei isso no livro pois tive que responder a vários e-mails de pessoas que elogiavam mas diziam que eu tinha muita coragem de enfrentar meus superiores hierárquicos, meus chefes, enfim, daí eu esclarecer que o procurador não tem superior hierárquico e nem chefe no exercício da função.

Diário - Como se dá a atuação dos procuradores-chefes então, apenas do ponto de vista administrativo?

Pastana - Exatamente. Eu costumo dizer que a chefia administrativa pode tirar o meu telefone, pode cortar a minha internet , mas não tem poder para tirar uma vírgula do que eu escrevo, então essa independência é nova e eu fiz valer, através do nosso trabalho, com respeito, com dignidade, trabalhando com a imprensa, informando tudo o que podia informar, não sonegava informação mas eu mantinha sob sigilo aquilo que era necessário.

Diário - Voltando àquele assunto sobre o quarto poder, o jornalista Carlos Chagas, que já foi promotor público, disse certa vez que o problema é quando o membro do Ministério Público quer ser imprensa ou quando a imprensa quer ser Ministério Público. O que o senhor acha disso?

Pastana - Concordo em gênero, número e grau com ele. E tem mais, tem outro problema também que não envolve somente o Ministério Público, envolve também o Judiciário e a Polícia. Às vezes o procurador quer ser juiz e o juiz quer ser procurador... (risos) Mas a minha opinião pessoal e não a opinião do Ministério Público, mas cada um tem que cumprir a sua função. Eu por exemplo não serviria para ser magistrado. Na verdade nós do Ministério Público também somos magistrados, só não somos magistrados de pé, magistrado ativos, não é só a acusação também, eu agi várias vezes a favor do réu, assim como na acusação. Mas a função do magistrado é extremamente delicada porque ele é o julgador e tem que ser igual à mulher de César (o imperador romano): não basta ser honesto, tem que parecer honesto.



Perfil


O paraense Manoel do Socorro Tavares Pastana, nasceu na Ilha do Marajó, no Pará, filho de pais muito humildes. Começou a trabalhar como fa-xineiro mas sempre estudou e buscou nisso garantir um futuro melhor. Tentou cinco vezes ingressar na Aeronáutica, como sargento, até conseguir. Passou lá cerca de cinco anos, tempo suficiente para formar-se em Direito e a partir daí tentar novos concursos públicos nessa área. Foi oficial de Justiça do Superior Tribunal de Justiça, em Brasília e depois ingressou no Ministério Público Federal, na carreira de procurador da República. Trabalhou em Campos (RJ), Brasília (DF), Rio Branco (AC) e Macapá (AP). Atualmente está na Procuradoria Regional da República da 4ª Região, atuando junto ao Tribunal Regional Fede-ral, que engloba os três Estados da Região Sul.

Um comentário:

  1. REcomendo o livro muito bom, Não São falacias Faz citações diretas a Site do Orgão Público para verificação;

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