quarta-feira, 10 de maio de 2017

REPORTAGEM | Os riscos da aviação regional na Amazônia.

Recentemente foi o ministro Teori Zavaski, mas na história do Amapá outras personalidades morreram em acidentes aéreos, como os então deputados Coaracy Nunes e Dalto Martins, suscitando o debate.
Foto: Acervo Márcio Vom Kruger

Cleber Barbosa

Para a Revista Diário

O avião é o meio de transporte mais seguro que existe – só perde para o elevador – e as estatísticas estão aí para comprovar. Mas ao longo da história alguns acidentes aéreos provocaram além de comoção muita discussão a respeito da segurança da aviação. No caso do Amapá, em particular, onde muita gente importante morreu em acidentes aéreos, a pergunta que não quer calar é se é mais difícil voar por aqui, na Amazônia.
Uma das primeiras tragédias de que se tem notícia foi a que vitimou o então deputado federal Coaracy Nunes, o suplente de deputado Hildemar Maia e o piloto Hamilton Silva – que são hoje nomes de ruas importantes de Macapá. Eles viajavam até a localidade de Nossa Senhora do Carmo, região do rio Macacoary, na manhã do dia 21 de janeiro de 1958, quando o avião Paulistinha CAP-4 em que viajavam caiu num dia de chuva fina.
Mas antes disso, Macapá teria outra experiência marcante com aviões. Na verdade hidroavião, segundo o jornalista e historiador Nilson Montoril. Foi a primeira aeronave a sobrevoar a pequena Macapá, assustando muita gente que jamais avistara algo assim nos céus. “Teve até quem corresse para a igreja e soldado confessando seus pecados para a esposa achando que era  o fim do mundo”, conta.
Arquivo Porta Retrato

Deu ruim
Outro episódio emblemático foi quando a mineradora Icomi S.A. fez festa para inaugurar sua pista de pouso, mas logo no primeiro dia o único avião a viajar para a Serra do Navio sofreu um acidente, levando a direção da empresa a abandonar seu projeto de ter um aeródromo. A aeronave perdeu o trem de pouso na aproximação para o pouso, quando atingiu a copa de algumas árvores. Felizmente ninguém saiu ferido e a aeronave caída viraria atração turística depois.

Saiba mais sobre os desafios de se voar na floresta amazônica
Para entender melhor as discussões a respeito da segurança da aviação regional, a reportagem foi ouvir a opinião  de quem atua no setor, como os pilotos e também o atual diretor do Departamento de Transportes Aéreos do Estado, Carlos Lima. Mais conhecido como Comandante Carlão,  ele admite que voar na Amazônia tem sim suas peculiaridades e até riscos adicionais. “Principalmente com relação a falta de apoio em solo”, resume ele.
E quais seriam esses apoio?  Para ele um dos principais é a cobertura do sinal de rádio, o que faz os pilotos percorrerem grandes distâncias sem conseguir contato com qualquer torre de controle ou mesmo pistas de pouso. “E aqui a gente ainda tem o chamado cone do silêncio, uma grande área compreendida entre o Rio Araguari, Calçoene e Oiapoque, que não possuem a comunicação bilateral”, explica Lima.
Outra característica dessa região é que voando a 10 mil pés, por exemplo, os pilotos encontram baixas temperaturas nessa região até a fronteira, causando riscos de formar gelo e prejudicar os comandos de navegação, além de reduzir a velocidade da aeronave. “Para isso, as empresas costumam pintar de preto o bordo de ataque, aquela parte frontal da asa, para identificar melhor possível formação de gelo. São nossos macetes”, conta o Comandante.
Outra curiosidade, para não dizer um paradoxo, é que com os avanços tecnológicos, como a navegação por GPS e as melhorias no Transponder, alguns sistemas antigos foram sendo abandonados, como algumas frequências de rádio que antes até possibilitavam uma melhor cobertura aos comandantes.
Queda do avião da Fretax no Vale do Jari, em 2013, que resultou em dez mortos. O mau tempo teria sido o maior causa da tragédia, pois o piloto preparava para o pouso.

TEMPO
Sobre isso, outro piloto consultado, Comandante Vitor Santos, diz que um dos grandes desafios da aviação são as condições meteorológicas, daí a importância do radar a bordo. “Mas ainda existem aviões sem esse aparelho, o que faz o piloto entrar na nuvem praticamente de olhos fechados, sem saber exatamente que tipo e qual o tamanho daquela formação”, diz. E até para isso existem técnicas bem amazônicas. Na volta para Macapá, os pilotos costumam sintonizar o rádio do avião na frequência 630 AM, da velha Rádio Difusora de Macapá. “Isso faz com que eventuais tempestades na rota apareçam como interferência na transmissão da rádio e até fazendo a agulha da bússola ficar tremendo”, diz o piloto amapaense.
Mas, de acordo com informações de antigos garimpeiros, a situação já foi pior no passado. Como na época da corrida do ouro no Amapá, época em que todo tipo de improvisos eram constatados, como decolar amarrado por uma corda. Era devido ao excesso de peso das cargas e das pistas clandestinas, normalmente muito curtas. Era um desafio voar para lá.

PERSONAGENS
O piloto amapaense Jorge Mareco, que é comandante dos modernos jatos da Latam Airlines, começou sua carreira na aviação regional, mas sai em defesa do setor, onde, inclusive se deu sua formação como piloto, no Aero Clube do Pará. Hoje, na aviação comercial, fala dos avanços e da tecnologia embarcada e o quanto isso ajuda a segurança. “Foi-se o tempo que voar era perigoso, pois hoje em dia é muito mais seguro você sair daqui para Belém em uma aeronave de grande porte do que ir daqui até a Praça Zagury de carro, quando pode sofrer um acidente de trânsito”, compara o profissional.
Ele diz ainda que toda essa tecnologia empregada diminui drasticamente a possibilidade de falha humana. “O computador está ali para ajudar a gente, mas claro que na hora em que ele falha, tem lá um ser humanos para controlar, daí eu dizer que a gente não pilota os aviões, a gente os gerencia”, completa o Comandante Mareco.

ACIDENTES
Entre os registros de acidentes fatais por aqui, antes daquele que vitimou o deputado e piloto Dalto Martins, em 2012, houve um emblemático, em 2001, quando o Comandante Pedro, recém transferido do Mato Grosso para Macapá, caiu com um monomotor com duas índias e duas parteiras a bordo. Elas viajavam de Oiapoque para Macapá. O piloto não teria seguido recomendações da torre de controle e decolou com um das piores formações de nuvens que existem para a aviação, o temido ‘Cumulonimbus’, apelidada pelos pilotos como cebezão. O mau tempo fez o comandante perder o controle da aeronave, caindo entre as montanhas, sem sobreviventes. Os pilotos locais disseram que naquelas condições até é possível voar, mas não por instrumentos, mas sim um voo visual, feito pela Costa do Amapá, o que demanda mais tempo, porém com mais segurança.
Em 2013, um acidente com um Embraer Carajá de prefixo PT-VAQ, pertencente à empresa Fretax. O avião caiu na aproximação para o pouso em Monte Dourado (PA), na região do Vale do Jari, matando dez pessoas, entre elas o piloto José Carlos Vieira Junior.

DICAS 
Mas não há motivo para pânico, afinal o gigantesco número de pousos e decolagens comparados com os raros acidentes aéreos atestam a segurança, então são algumas dicas para aproveitar a viagem.
– É comum o piloto falar “afivelem os cintos pois iremos passar por uma forte turbulência”. Isso não é o mesmo que falar “o avião vai cair” é apenas para aumentar sua segurança.
– É comum sentir um desconforto nos ouvidos ou ficar “meio surdo”, para melhorar tente simular um bocejos ou masque um chiclete, pois o movimento de mastigar ajuda a destapar.
Então uma boa viagem!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Contribua conosco!

PUBLICIDADE