domingo, 17 de janeiro de 2016

INDÚSTRIA | Por que a mineração parou no Amapá?

Considerado historicamente uma província mineral, o Amapá ainda amarga uma triste sina desde a paralisação da mineradora Icomi, pois os projetos sucessores não emplacam como poderiam.
PEDRA BRANCA DO AMAPARI |  O município era pujante no início da década, mas agora tem um enorme elefante branco com a paralisação da Zamin. 

Por Cleber Barbosa
Para a Revista Diário

O estado do Amapá entrou para o noticiário econômico do país e do mundo desde a descoberta das jazidas de manganês, nos anos 50, quando o até então maior projeto de mineração da Amazônia se implantou, a Icomi S.A. (Indústria e Comércio de Minérios).  Com a paralisação da lavra do minério, em 1997, em Serra do Navio, a cidade e os municípios cortados pela ferrovia que escoava a produção passaram a viver sob a ameaça de virar um lugar fantasma. Outros projetos minerais vieram depois, movimentaram o mercado, geraram emprego e renda, mas não prosperaram.
A luz do fim do túnel acendeu quando o (então) bilionário Eike Batista implantou o consórcio MPBA e MMX Mineração, que explorou ouro e minério de ferro, respectivamente, em Pedra Branca do Amapari e Serra do Navio. Outras empresas também tiveram seu lugar ao sol, mas igualmente interromperam a produção tempos depois, como a Novo Astro, Vila Nova, Beedel, Paula Abib, Unagem, além das sucessoras da MMX, que foram a Anglo American e, mas recentemente, a Zamin Ferrous.
Não se pode esquecer do projeto Jari, iniciado nos anos 80 e que até hoje não atendeu as expectativas, desde o período da gestão do idealizador Daniel Dudwig, como também quando um consórcio liderado por empresários brasileiros de peso como o próprio Augusto Trajano de Azevedo Antunes e seu amigo  Amador Aguiar, dono do Banco Bradesco.

FÔLEGO
Atualmente o estado criou um órgão voltado a fazer essa interlocução com o setor. Trata-se da Agência de Desenvolvimento Econômico do Amapá, uma fusão entre a Seicom (Secretaria da Indústria, Comércio e Mineração) e a AFAP (Agência de Fomento do Amapá).

Geólogo explica tese da "maldição da mineração" de pesquisadora
Um dos mais respeitados geólogos em atuação no Amapá, Feijão traça um diagnóstico do setor da mineração no estado e analisa a polêmica teoria levantada por uma pesquisadora para sua dissertação de doutorado, quando usa a expressão ‘maldição da mineração’.
Mas o que poderia explicar toda essa maré de notícias ruins sobre o setor da mineração no estado? O geólogo Antônio da Justa Feijão, que além de ex deputado federal também foi diretor do DNPM (Departamento Nacional da Produção Mineral), diz que há ainda um contexto de mercado, que  é internacional e que não anda assim tão favorável aos negócios com mineração.
Ele diz que mesmo no auge da produção de empresas como a Anglo American no Amapá, era difícil fazer frente ao preço praticado por outras regiões produtoras de minério de ferro, dentro do próprio país. “O preço do minério de ferro que era de U$ 40 a U$ 60 dólares a tonelada, enquanto que a Vale vendia o minério de ferro por até U$ 25 dólares a tonelada”, diz o especialista.
Ainda há outra situação emblemática, um complicador a mais para a dura realidade local amapaense, que são os custos com a logística de transporte. Enquanto os navios “Panamax”  (maiores cargueiros a entrar no Canal Norte do Amazonas) possuem uma capacidade de transportar 190 mil toneladas de minério, o porto do Itaqui (MA), que embarca a produção da Vale das minas de Carajás (PA) existem gigantes com capacidade para 380 mil toneladas, os navios chamados “King Size” ou “Vale Size”. “Ou seja, eles transportam em um só navio aquilo que quatro a seis navios daqui conseguem carregar”, compara Antônio Feijão.
Feijão explica que a mineração do Amapá é considerada como de pequena escala, pois o único bem mineral que tem volume em grande escala é o caulim, mas ultimamente o Pará entrou com uma concorrência muito forte de tal forma que o preço do minério caiu muito. “E também por força de navegação e de calado de navio nós temos a competição da mina de Caulim da Cadan, no sul do estado, operando em baixa”, diz o geólogo.
Todos os demais commodities de mineração no Amapá são de pequena escala, como o próprio ferro, que é de pequenos volumes. “O tântalo aqui tem em muitos lugares, mas em pequenos volumes também; a cassiterita tem em muitos lugares, mas em pequenos volumes;  e o ouro tem em muitas pequenas jazidas, mas em pequenos volumes; de tal forma que o Amapá sempre será um estado que terá muitas minas em produção, mas nenhuma delas em escala suficiente para se destacar como foi o manganês da Serra do Navio e o caulim na década de 90 e no início do novo milênio”, diz.
Ele ressalta ainda que a mineração de ferro no Amapá, que até então jamais havia sido algo que desse notoriedade ao estado, se propagou pelo mundo com a mineradora Anglo American, que se instalou no estado. Impulsionada também com o preço internacional do ferro, que chegou a superar os U$ 200 dólares por tonelada, mas que hoje tem um valor de mercado entre U$ 42 a U$ 46 dólares.
A publicação da obra da pesquisadora Maria Amelia Enríquez (foto) levanta debate a respeito da melhor postura a respeito do uso sustentável das riquezas minerais.
Mas há quem vá mais longe nessa questão da mineração. E gente importante como a professora Maria Amélia Rodrigues da Silva Enríquez, que teve publicada sua tese de doutorado em que lança um questionamento emblemático: “Maldição ou Dádiva? Os dilemas do desenvolvimento sustentável a partir de uma base mineira”.
A pesquisadora faz algumas importantes perguntas nesse trabalho de dissertação, como se a atividade extrativa mineral de larga escala é mais benéfica ou maléfica para uma cidade, região ou país. “Que efeito tem o uso dos royalties minerais, como a Contribuição Financeira pela Exploração Mineral, a CFEM?”, diz ela.
Para responder a essas questões foram estudados os 15 maiores municípios mineradores do Brasil, além de quatro municípios canadenses, com o propósito de fundamentar as análises comparativas. A partir de uma série de indicadores ambientais, econômicos, sociais e de governança, comparou-se a trajetória dos municípios mineradores brasileiros nas últimas duas décadas com a dos seus entornos não-mineradores. Os resultados demonstram que a pressão do mercado internacional e os marcos regulatórios ambientais têm contribuído para o surgimento de uma atividade mineradora mais responsável com a dimensão ambiental do desenvolvimento. Foi constatado ainda que a mineração é um importante fator de crescimento econômico e de estímulo ao desenvolvimento do capital humano dos municípios de base mineira, achado que contraria vários estudos sobre o tema que enfocam os países mineradores, muito embora no Brasil haja um viés que faz com que a intensidade desses efeitos varie fortemente de acordo com a região geográfica do empreendimento mineiro. Outro achado é que a mineração, por si só, não resolve automaticamente dois graves desafios do processo de desenvolvimento sustentável – o de geração de emprego e o de garantias de equidade na distribuição de benefícios entre a atual e as futuras gerações.

ALERTA
Para Antônio Feijão, as reflexões da pesquisadora que chega a usar a expressão “maldição da mineração”, na verdade trata-se a um episódio da década de 70 quando achou-se petróleo na costa da Holanda, ocasião em que os pequenos fazendeiros agropecuaristas locais deixaram de fazer seus laticínios, queijos, doces e floriculturas para ir trabalhar na petrolífera. “Isso fez uma regressão de economias locais que sempre foi a força daquele país, daí ter surgido a expressão ‘maldição da Holanda’, que a doutora Maria Amélia Enríquez usou em sua tese de doutorado, adaptada para a mineração normal, mas ela não diz que é uma maldição, mas alerta que não se pode parar outras economias em função da mineração”, diz o geólogo Antônio Feijão.

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