quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Zé Miguel decide falar: "Não saio"

"Não vou pedir para sair, vou ficar até o fim"





Zé Miguel - Secretário da Cultura diz que ataques estão prejudicando sua carreira de cantor

Muita gente se refere ao cantor e compositor amapaense Zé Miguel como "Vida Boa", numa alusão direta a um de seus maiores sucessos musicais. Mas nas duas últimas semanas ele não tem tido vida mansa, não. Pelo contrário, está debaixo de um forte movimento por parte de conselheiros descontentes do Conselho Estadual de Cultura, para que deixe o cargo de secretário estadual da Cultura, que ele assumiu há nove meses. Ontem Zé Miguel decidiu falar. Foi ao rádio rebater as acusações que estão sendo feitas sobre sua gestão e garantiu que está prestigiado pelo governador Camilo Capiberibe (PSB). Mais que isso. Zé Miguel garante que não teme as ameaças de antigos companheiros de lutas e que vai permanecer no cargo até que lhe seja dada a atribuição pelo Chefe do Executivo. O Diário do Amapá publica a seguir os principais trechos da entrevista de Zé Miguel, que fala também a respeito da passagem da CPI do Ecad por Macapá e sobre os direitos autorais.


CLEBER BARBOSA
DA REDAÇÃO


Diário do Amapá - Há duas semanas que a cultura em está em pauta no meio político local especialmente com a passagem da CPI do Ecad pela Assembleia Legislativa, onde artistas como Nilson Chaves até brincaram pelo fato de serem chamados de depoentes, expressão pesada não?
Zé Miguel -
Pois é... [risos] Na verdade essa CPI do Ecad é necessária de ser levantada e eu inclusive quero aproveitar aqui e já mandar um recado para os nossos companheiros da Amcap, da Amaps, da Ascom, enfim, de todas as associações que lidam com os artistas, com os músicos e as outras associações, no caso a Fata, que lida com o pessoal do teatro e dizer que os direitos autorais não são pertinentes apenas a música, mas sim a qualquer obra intelectual.

Diário - Muita gente não sabe disso?
Zé Miguel -
Sim, houve uma provocação por parte da Comissão, a CPI, em relação a gente instituir aqui um modelo, um projeto piloto no processo de arrecadação, do ponto de vista regionalizada, e distribuição, no caso. O titular do Ecad então se prontificou a entrar em contato comigo para que gente já pudesse montar esse modelo. Ele não entrou em contato comigo e eu então sugiro aos representantes das associações que possamos nos reunir um dia desses aí, pode ser até nessa semana que vem, apesar de que esta semana vou estar extremamente ocupado, mas a idéia é nos reunir e pensar alguma coisa quem sabe encaminhar um documento para a CPI dizendo que o Ecad não se manifestou, para que a gente possa dar algum andamento.

Diário - O que o senhor achou dessa proposta, de fazer algo por aqui mesmo?
Zé Miguel -
Achei essa proposta muito boa, inclusive porque pode colocar o Amapá na história, com essa expe-riência piloto.

Diário - Essa foi uma proposta feita pelo senador Lindbergh Farias, que é o relator da CPI, não foi?
Zé Miguel -
Isso mesmo.

Diário - Aliás, muita gente comentou a forma dura com que ele fez as oitivas, não perdeu aquela pegada, digamos assim...
Zé Miguel -
Ele e o senador Randolfe Rodrigues, que se comportaram ali como representantes da CPI, eles questionaram, pressionaram o dirigente do Ecad que ficou ali na defensiva. O Ecad na verdade não tem muito o que dizer, o Ecad tem muito o que pagar. O Ecad já nos roubou muito, essa é que é a verdade. Você viu a colocação do Nilson Chaves sobre um tal de direito retido?

Diário - Quer dizer exatamente o que, secretário?
Zé Miguel -
O Nilson tem uma música chamada "Sabor açaí", mas se alguém por acaso escrever "sabor de açaí", mesmo que eles saibam que a música é do Nilson, mesmo que haja gravação, fica retido. O direito retido é um negócio enorme, que fica acumulado e na verdade o Ecad fica se utilizando desses recursos. Essa é uma coisa que realmente chateia muito.

Diário - Quando o representante do Ecad deu a informação de que entre o Pará e o Amapá foram arrecadados só no primeiro semestre deste ano quase dois milhões de reais, todos quiseram saber quanto ficou disso no Amapá e eles simplesmente não disseram, não é mesmo?
Zé Miguel -
Enrolou e não disse nada. E não veio nada. Eu mesmo, tem aí uns dois anos que não recebo nada, nem um centavo, como eu comentei lá e que aliás foi publicado erroneamente em um dos jornais, um comentário maldoso. Eu aceito as críticas, mas quando há a atitude maldosa eu fico realmente muito triste com isso. Eu recebi uma vez aqui, foram R$ 4,7 mil e não só R$ 4 mil, viu editor? Recebi de uma vez só porque a minha associação conseguiu arrecadar, pois foi um ano que o Ecad foi para a Expofeira, cobrou direitinho e fizeram todo o processo como devem fazer, com os borderôs, que foram reco-lhidos, fizeram as gravações e detectaram que as minhas músicas foram muito executadas na Expofeira naquele ano.

Diário - E fora essa experiência, não funcionou mesmo?
Zé Miguel -
Fora isso eu sempre recebi, mas coisas pequenas, R$ 35 ou R$ 150, o que a gente já achava muita grana... [risos]

Diário - A obrigação de pagar pelos direitos autorais não se aplica quando se executa as músicas em casa, apenas em local público, é isso?
Zé Miguel -
Apenas veiculação pública. Se você tem um restaurante e você põe lá um radinho de pilha para tocar uma música enquanto as pessoas almoçam, aí você está utilizando publicamente a obra intelectual.

Diário - E quanto é que incide, basicamente, a execução de uma música, para que se tenha uma noção?
Zé Miguel -
Até isso é muito nebuloso, não dá para a gente saber, são valores pequenos por execução. Cada vez que uma rádio toca ela, paga centavos, a questão é que muitas rádios tocam muitas vezes a mesma música...

Diário - Então não tem estrutura no Ecad para garantir uma fiscalização mais eficiente para que se possa aferir a execução das obras, como é feito então?
Zé Miguel -
É, não tem, eles fazem por amostragem. O Ivo Cannuti foi muito feliz nas suas colocações, aliás, ele estava muito interado, então de dez rádios eles pegam três, em dias alternados, então e se a minha música não toca nessas três que foram escolhidas, só toca nas outras? Então a meu ver é um sistema extremamente falho.

Diário - Mas secretário, desde a semana passada que a cultura vive uma fervura, não só pela passagem da CPI do Ecad, mas também pela polêmica votação de um projeto enviado pelo Governo do Estado à Assembleia Legislativa, mexendo na composição do Conselho Estadual de Cultura e acabou sobrando para o senhor, com direito a carro de som nas ruas e pedidos para o senhor sair. Qual é a avaliação que o senhor faz desses episódios?
Zé Miguel
- Eu vejo com tristeza a manifestação, inclusive por parte de algumas pessoas específicas que me decepcionaram profundamente pelas atitudes. No caso do presidente do Conselho, que vou citar o nome, o senhor João Porfírio, já era de se esperar, pois é do perfil dele, do estilo. Ele é uma das pessoas que, caso esse projeto de lei passe na Assembleia, será diretamente atingida, porque ele é um dos indicados do governo e que teoricamente representam dentro do Conselho o governo e que faz oposição aberta à nossa gestão, à minha gestão como secretário e à gestão do governador Camilo. Desde o primeiro dia ele nunca escondeu isso, com atitudes absurdas.

Diário - Nessa polêmica toda um dos fatos mais agudos foi o presidente João Porfírio ter lançado um desafio da tribuna da Assembleia Legislativa de que renunciaria a seu mandato caso o governador autorizasse a abertura de um processo de investigação contra o senhor. O que há para se investigar?
Zé Miguel -
Nós estamos vivendo tempos de transparência, então as contas do Governo estão na Internet. Eu me angustio em relação a isso, poxa, se está na internet está para todo mundo. Por que os conselheiros não acessam o portal do Go-verno para fazer essas averiguações lá, por que o conselheiro Porfírio quer instaurar uma investigação? Eu acho que o Ministério Público pode observar no portal da transparência e se ele [MP] vir que há necessidade se fazer uma investigação na Secult o Ministério Público vai fazer. A meu ver o que acontece é um processo político de tentar desarticular politicamente o Governo e de defesa do senhor João Porfírio de seu mandato, que é natural, já que o Porfírio tem um salário inte-ressante e não é fácil de você abrir mão de um CDS-4, sei que isso vai fazer falta pra caramba no orçamento da pessoa se ele for afastado em algum momento.

Diário - Como artista o senhor é quase uma unanimidade, então depois dessa confusão toda não pensou "o que é que estou fazendo aqui", deu vontade de sair?
Zé Miguel -
Eu nunca imaginei que a coisa fosse chegar a esse ponto, me decepcionei com pessoas que eu tinha na mais alta conta e vi ali, fiquei sem entender. É bom lembrar que são poucas pessoas. Mas essa é uma coisa que me prejudica muito como artista, está prejudicando demais a minha carreira. Em vários momentos eu já pensei em ir lá com o governador e di-zer que quero me afastar da Secretaria, pois estou me prejudicando tentando ajudar as pessoas. Estou fazendo um bom trabalho, infelizmente uma parte da imprensa não mostra. Então eu não foi pedir para sair, eu tenho um compromisso com o meu partido, com o Governo e não vou aceitar ser deposto por qualquer um que ache que pode dizer ao governador que tem que exonerar o secretário, fazer isso ou aquilo. Eu não aceito. Se o governador um dia me chamar e dizer que não precisa mais de mim eu aceitarei, tudo bem, mas não é o caso, a nossa relação está muito boa. Então não fiquem pensando que eu vou me amedrontar com ameaças, ou pedir para sair porque eu não vou, vou ficar até o fim, se Deus quiser.



Perfil


O amapaense José Miguel de Souza Cyrillo nasceu em Macapá, tem 49 anos de idade, é casado e pai de quatro filhos. É cantor e compositor, foi presidente da Associação dos Músicos e Compositores do Amapá (Amcap) entre 2002 e 2004 e Chefe da Divisão de Programação e Difusão de Eventos, da antiga Fundação Estadual de Cultura, a Fundecap, entre 1995 e 1997, periodo em que ajudou a instituir o Encontro dos Tambores. É filiado ao Partido Socialista Brasileiro, o PSB, legenda pela qual já disputou duas eleições para deputado estadual. Desde janeiro deste ano assumiu a titularidade da Secretaria Estadual da Cultura.



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