sábado, 14 de setembro de 2013

Artigo do bispo diocesano de Macapá, dom Pedro Conti

Perdoe-me por eu ser tão burro
Quando ainda seminarista, João Maria Vianney, o futuro santo Cura d’Ars, tinha grandes dificuldades na escola. Não conseguia entender as noções mais simples. Os superiores do Seminário o mandaram de volta para casa inúmeras vezes, mas ele teimava em querer voltar. Já tinha 21 anos e sentava na escola com alunos que tinham dez anos a menos do que ele. Um desses alunos, com onze anos, começou a ajudá-lo nos estudos. João Maria era muito agradecido ao seu pequeno mestre, no entanto as dificuldades continuavam. Ele não entendia, esquecia, perdia-se, não conseguia se expressar direito. Certo dia, o menino queixou-se disso com os outros colegas da turma. João Maria escutou a conversa. Levantou-se da sua mesinha, ajoelhou-se na frente do colega e lhe disse: “Perdoe-me por eu ser tão burro!”.
Devemos reconhecer que a humildade foi uma das grandes virtudes dos santos. Não deveria ser diferente para nós que queremos seguir Jesus e praticar os seus ensinamentos. Mais uma vez, ele nos manda o seu recado. O faz por meio de uma parábola. Bom observador e conhecedor dos corações humanos, Jesus viu a ambição das pessoas em ocupar os primeiros lugares numa refeição na casa de um dos chefes dos fariseus. Não perdeu a oportunidade de convidar a todos a serem mais humildes, a não exaltar-se tanto, achando-se superiores aos outros. Muito mais sábio é aquele que senta no último lugar. Se merecer, será chamado mais perto do anfitrião. Se não, ficará tranquilamente no seu lugar, sem passar a vergonha de ser convidado a sair para dar lugar a outro mais importante.
É tão simples o ensinamento de Jesus que parece óbvio. No entanto parece mesmo que nós todos sejamos ambiciosos por natureza, que cada um de nós tenha uma autoestima tão grande que seja capaz de conduzir-nos ao orgulho, à arrogância, à busca de posições privilegiadas. Muito difícil é aceitar ficar para trás. Todos queremos aparecer, ser notados, chamar atenção.
Vivemos na sociedade das aparências, das disputas e da propaganda. Não importa se a nossa imagem é falsa, corrigida pelo computador, ou enfeitada por palavras enganosas. O que vale é estar na frente. Exageramos com os adjetivos superlativos. Tudo é apresentado como o melhor; nunca teve algo comparável na história. Os chamados “campeões” não aceitam comparações. Alguns já foram declarados os me-lhores do milênio. Talvez do milênio passado, porque o novo mal começou. Depois de tanta exaltação nossa e dos bajuladores de plantão, quando percebemos que, obviamente, tem outros melhores de que nós, sofremos como se fosse o pior fracasso do mundo. A distância que separa a glória do desespero e da depressão está se tornando curta demais. Estamos exagerando, estamos perdendo o bom senso e a consciência das nossas limitações humanas.
É por isso que a humildade é uma grande virtude e é a virtude dos grandes homens e das grandes mulheres. Grandes de verdade e não somente pelas aparências ou a propaganda. “Quem se humilha será elevado” nos lembra Jesus neste domingo (Lc 14,11). A alegria da verdadeira pessoa humilde não está em aparecer, mas em ter consciência do seu valor e, ao mesmo tempo, das suas limitações. Sabe que pode colaborar, e muito, para o bem de todos e coloca os seus talentos a serviço dos outros. Sabe também promover as qualidades dos outros, não precisa competir, porque cada um também tem as suas qualidades e deveria saber usá-las para o bem comum. O exemplo mais simples são as nossas próprias famílias. Se todos querem disputar quem manda mais, a convivência vira um inferno. Mas se o pai é pai, a mãe é mãe e os filhos sabem ser filhos e, com isso, todos colaboram com o seu papel, nasce a paz familiar e cresce a alegria de estar junto. Também as crianças, que não podem colocar dinheiro em casa, alegram a todos com as suas brincadeiras, a sua animação, o seu carinho. Elas, juntas com outros pequenos, como os pobres, os aleijados, os coxos e os cegos, poderiam ser as primeiras a serem convidadas para uma festa, porque nunca poderão devolver da mesma forma. Dizendo a verdade, os pais espe-ram que um dia elas, as crianças crescidas, devolvam o amor recebido. Elas o farão, sim, com a condição de ter experimentado a gratuidade do amor e da doação. Não o saberão fazer se somente viram disputas, interesses, negociações. Talvez nos faça bem ficar de joelho e dizer desta vez ao próprio Senhor, mais ou menos, como São João Maria Vianney, que ele nos perdoe por sermos tão burros no nosso orgulho perdendo assim a oportunidade de fazer o bem, amar e ser amados pela grandeza própria do amor e da humildade. Sem outros objetivos ou adjetivos.

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