SENADOR RANDOLFE - Ele integra a Frente Parlamentar contra a Corrupção |
“A representação é apenas uma formalidade porque já há elementos da quebra de decoro. Existe o tempo político e o tempo jurídico, uma coisa não interrompe a outra”
Pergunta – Nota publicada em um jornal considera “estranho” o senhor ter representado contra Demóstenes Torres, uma vez que são amigos.
Randolfe Rodrigues - É importante e necessário separar o espaço da política do espaço da coisa pública, o espaço da República. A política deveria ser, embora muitos políticos não o façam, o espaço do sacerdócio público. E sacerdócio é abnegação e renúncia. Quem é sacerdote renuncia aos prazeres individuais em favor de algo coletivo. Esse é o sentido e o dever ser da política mas, geralmente, o que acontece é a deturpação.
Política é o espaço da res pública, do debate da coisa pública. É lógico que no espaço do parlamento se estabelecem relações privadas, mas o parlamento não é uma confraria. Eu não aceito nessa argumentação de que “aqui somos todos colegas”, “aqui um não mexe com o outro”. Quem defende isso, esquece que neste momento o espaço em que está não pertence a si, não é um espaço individual, não é uma confraria, não é o espaço das relações privadas, é o espaço da representação popular.
Aliás, a Constituição da República é mais rigorosa com o comportamento ético do parlamentar do que contra qualquer outro servidor público. Não é a toa que o nosso Estado de Direito, fundado nas bases da antiguidade clássica romana, definiu que o espaço da representação pública deve ser o espaço dos interesses públicos, de onde os assuntos privados devem ser afastados.
Pergunta – Como o senhor se sentiu ao representar contra o senador Demóstenes?
Randolfe – Não é confortável, logicamente, representar contra nenhum colega e eu preferiria que não fosse necessário. Mas, sou chamado a decidir entre as minhas relações pessoais, particulares e a coisa pública. Não resta alternativa para um parlamentar, quando chamado a este dilema, a não ser optar pela defesa do interesse coletivo. Então, não tem nada de pessoal e não terá nada de particular todas as vezes que eu for chamado para atuar e representar em defesa da instituição.
Pergunta – Ao mesmo tempo, o senhor vem sendo cobrado para representar contra o senador João Alberto Capiberibe em função das recentes denúncias sobre a suposta compra de uma casa com recursos do SUS.
Randolfe – Outrora, o ex-senador Gilvan Borges foi denunciado em um processo envolvendo a Funasa. Fui provocado para representar contra ele. Hoje, aliados do senador Gilvan me provocam para representar contra o senador Capiberibe. Os grupos em conflito podem ficar tranquilos, porque eu representarei contra quem tiver que representar, quando tiver elementos para representar. A representação no senado federal não vai ser por razões de conflitos, de brigas particulares. Representação tem que ser motivada quando tiver elementos.
Quando ocorreu a primeira denúncia em relação ao senador Demóstenes, eu e o senador Pedro Taques o procuramos e perguntamos para ele se havia mais alguma coisa a surgir, e ele nos disse que não. Fomos à tribuna e lhes demos um voto de confiança. Lamentavelmente, há um inquérito da Polícia Federal em curso, há um procedimento da Procuradoria Geral da República, há um pedido de abertura de inquérito contra um senador da República.
Representação no Conselho de Ética do Senado Federal não pode ser objeto para picuinhas e brigas locais. É um instrumento para ser utilizado quando o Senado da República, quando a instituição estiver sob ameaça. Pois, quando a instituição está ameaçada é a democracia que está ameaçada e isso exige do homem público que separe a relação privada da ação pública.
Pergunta – Nesse caso envolvendo o senador Capiberibe, especificamente, o senhor não vê nada que justifique uma representação?
Randolfe – Assim como anteriormente, nas denúncias contra o senador Gilvan quando foi instaurado o procedimento pela Polícia Federal, enquanto não tivemos acesso aos autos não havia motivo para tanto. Não tentem transformar um mandato de senador da República numa delegacia de polícia. Eu não sou delegado de polícia e nem palmatória do mundo e nem vou atuar desta forma.
Tendo elementos concretos contra qualquer colega parlamentar eu não titubearei. Assim foi com o senador Demóstenes, que convivia comigo, foi convidado por mim para ir ao Amapá em um evento do Ministério Público e mesmo assim não titubeei. Mas, não tragam a briguinha, a picuinha política local como um elemento do debate político nacional. Quando tiver elementos contra quem quer que seja, não quero, inclusive, ter que representar sozinho. Gostaria de ter outros colegas de outros partidos junto comigo.
Nós temos que compreender que o parlamento não é uma confraria, um local de amigos. É o lugar da coisa pública.
Pergunta - Se acatar a representação, o processo contra Demóstenes será encaminhado ao plenário do Conselho, mas caso contrário, o seu partido precisa do apoio de outros cinco senadores para apresentar recurso contra o arquivamento da representação. O senhor teme que isso possa acontecer?
Randolfe - A representação é apenas uma formalidade porque já há elementos da quebra de decoro. Existe o tempo político e o tempo jurídico, uma coisa não interrompe a outra. O Congresso está sendo chamado a se manifestar sobre uma ocorrência grave.
Pergunta - O senhor está confiante de que a denúncia será levada adiante?
Randolfe - É para isso que, no Parlamento, existe Conselho de Ética: para que, havendo graves denúncias contra qualquer um de seus membros esse possa ter, em tal instância, o amplo e sagrado direito de defesa.
Pergunta - Qual o rito desse processo senador?
Randolfe - Depois de receber a representação, o órgão poderá designar três integrantes para compor uma comissão de inquérito para apurar os fatos. O senador denunciado deverá se defender em até cinco sessões ordinárias.
Se concluir pela perda do mandato, o Conselho deve enviar parecer à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) para exame dos aspectos constitucional, legal e jurídico. A decisão final cabe ao Plenário do Senado, em votação secreta, e por maioria absoluta.
Pergunta - O que acontece depois disso, se ocorrer a renúncia do parlamentar?
Randolfe - Ainda que o senador renuncie ao mandato durante a tramitação, a renúncia não produz efeitos até o final do processo. Caso seja condenado pela Justiça, o senador que renuncia para evitar cassação de mandato fica inelegível por oito anos após o fim do prazo original do mandato, de acordo com a Lei da Ficha Limpa
Pergunta - Para o senhor que apresentou na semana passada requerimento de informação sobre a demora na instalação da Comissão da Verdade, viu como aquela celebração dos militares reformados no Rio de Janeiro, em alusão ao Golpe Militar de 1964?
Randolfe - Isso é apologia ao crime, um atentado contra o estado de direito. Comemorar um golpe que quebrou a ordem democrática, impôs ao Brasil 20 anos de terror e tortura, equivale a celebrar, na Alemanha, o aniversário de Hitler.
Perfil
O pernambucano Randolph Frederich Rodrigues Alves nasceu em Garanhuns, tem 38 anos de idade, é casado é pai de dois filhos. É professor e bacharel em Direito. Começou sua vida pública como Assessor para a Juventude, do Governo do Amapá, em 1996. Elegeu-se deputado esta-dual em 1998, sendo reeleito em 2002. Concorreu como candidato a vice-prefeito na chapa emcabeçada por Camilo Capiberibe (PSB) para a Prefeitura de Macapá em 2008; em 2010 disputou a eleição para senador da República, sendo o mais votado daquele pleito, com mais de 200 mil sufrágios. Atualmente é membro tirular da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e da Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática (CCT), além de presidir da Comissão Parlamentar de Inquérito do Ecad (CPI do ECAD).
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